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Metade de Mim

“...Metade de mim é partida, a outra metade é saudade...”


Meu pai dizia que sempre deixamos um pouco de nós por onde passamos. Isso me faz pensar sobre qual é a marca que costumamos deixar , e se ela muda com o tempo.

Sobre partidas e mudanças, também acredito que levamos conosco um pouco de cada lugar por onde passamos, e de cada pessoa que conhecemos. Mas não acho que devemos levar tudo. Há coisas, pessoas e lugares que precisam sim, ficar para trás. Imagine o seguinte: quando você viaja e só pode levar uma mala de mão, você sabe que não dá pra levar tudo,então  você escolhe o que levar. Você decide baseado nas suas prioridades, na funcionalidade. Ou, pelo menos, deveria ser assim. Lembro que algumas vezes já me vi levando itens que eu jurava que  ia precisar, mas não usei, então eles ocuparam lugar à toa na minha mala, tirando espaço de outros itens que poderiam ser mais úteis, ou me fazendo carregar um peso desnecessário. Nem sempre precisamos ocupar todos os espaços, até porque senão não sobra espaço para o novo. 

Eu já vivi como se tivesse que ocupar todos os espaços. Como se fosse inadmissível um momento de ócio. Como se eu não produzisse o suficiente, o quanto deveria ou poderia, caso ficasse parada, ou caso não aproveitasse cada minuto disponível entre uma atividade e outra. Eu sou super a favor do trabalho duro, mas aquilo me estressava, sem eu perceber. E quando me dei conta, o excesso já havia tomado conta de mim por inteiro.

O verso do Oswaldo Montenegro, citado no início do texto de hoje, me faz lembrar que não existe partida sem renúncia. Se deixamos saudade, provavelmente deixamos uma boa marca, e se nós sentimos saudade, é porque fomos felizes “lá”. 

Não confunda saudade com remorso – isso é um pensamento que trago comigo. Todos nós vamos perder alguém, em algum momento. Seja porque a pessoa foi embora da cidade, do país, ou da empresa, pelo término de um relacionamento, ou pelo ponto final que a vida tem. Procuro dar o melhor de mim, para que neste espisódios eu possa chorar sim, mas de saudade, e não de remorso. E por “dar o melhor de mim” entenda “viver cada momento”. E vivê-los não como se fossem únicos – porque todos já os são – mas respeitando esta unicidade que existe em cada um deles. Imagino que o choro de remorso deve ser muito mais doído, pois vem carregado de culpa, arrependimento, mágoa e rancor. Já basta a tristeza da partida. Eu prefiro viver! Literalmente.E você?

Nossa vida é cheia de ciclos. Cada escolha que fazemos abre portas para o novo, mas também nos obriga a fechar outras. No entanto, o medo de renunciar ao que já conhecemos, ou de deixar para trás algo que um dia nos fez bem, muitas vezes nos paralisa. Queremos tudo ao mesmo tempo, mas esse receio de abrir mão de algo (ou alguém), de deixar ir, de entender que aquilo já cumpriu a missão que tinha em nossas vidas, pode nos fazer estagnar em um platô de mediocridade, frustração, apatia, cheio daquele sentimento “e se... ?”. “E se eu tivesse tentado?” “E se eu tivesse falado?” “E se eu tivesse começado?” “E se eu tivesse terminado?” “E se eu tivesse ido?” “E se eu tivesse ficado?”

Escolhas e renúncias estão no mesmo patamar de importância. Estabelecer prioridades, saber reconhecer oportunidades e limitações e entender que o desconforto do desconhecido é libertador e gratificante traz clareza – e consequentemente leveza – para o processo de tomada de decisão. Outro dia li uma frase do Geronimo Theml que entrou para o rol das minhas favoritas: “Ou você vive o desconforto de buscar a vida que deseja, ou o desconforto de continuar na vida que você não quer.” Faz todo sentido!

Assim como a mala de mão da viagem, a vida nos pede para selecionar com cuidado o que carregamos. E ao fazer isso, aprendemos que, ao abrir mão do que já não nos serve, ganhamos a chance de nos reencontrar com aquilo que tanto queremos.

Então, talvez o segredo esteja em acolher as partidas e as saudades como partes necessárias do nosso crescimento. Ao final, as renúncias feitas com consciência nos preparam para viver o novo de maneira mais plena. O que você precisa deixar para trás, hoje, para dar espaço ao novo?


 
 
 

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Anelice Marambaia

© 2025 por Anelice Marambaia.

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